O Ministério Público Federal (MPF) deu prazo de 60 dias para o governo Federal se manifestar sobre as irregularidades no licenciamento ambiental da usina hidrelétrica de Jatobá, uma das barragens previstas para o rio Tapajós, no Pará. Assim como em Belo Monte, São Luiz do Tapajós e as usinas do rio Teles Pires, Jatobá está sendo licenciada sem cumprimento da legislação brasileira.
Mais uma vez, o governo conduz o licenciamento ignorando a obrigação da consulta prévia prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Mais uma vez, ao planejar uma série de barragens em um dos principais rios da Amazônia, o governo ignora a obrigação de fazer as Avaliações Ambientais Integrada e Estratégica, previstas em vários diplomas da legislação ambiental.
O MPF enviou uma lista dos diplomas legais que devem ser observados e recomendou a suspensão imediata do licenciamento da usina de Jatobá, até que seja realizada a consulta prévia, livre e informada às populações indígenas e tradicionais afetadas e as avaliações ambientais. O documento, assinado pelos procuradores da República em Santarém, Luiz Hernandes, Carlos Raddatz e Ticiana Sales Nogueira, foi enviado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), à Centrais Elétricas Brasileiras (Eletrobras) e à Centrais Elétricas do Norte do Brasil (Eletronorte).
A legislação ambiental brasileira foi construída a partir dos dispositivos da Constituição Federal que instituem a proteção do meio ambiente como princípio que deve nortear todas as relações sociais, inclusive as econômicas e, em especial, aquelas voltadas à exploração de recursos naturais (artigo 170). A Constituição estabelece, no artigo 225, que é dever do poder público e da coletividade defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Para concretizar esses dispositivos, a Política Nacional do Meio Ambiente (lei nº 6.938/81) e a Política Nacional de Biodiversidade (decreto nº 4339/2001) previram a realização de avaliação ambiental que deve considerar o acúmulo e a sinergia de impactos para empreendimentos potencialmente poluidores, como é o caso das cinco barragens previstas no Tapajós. Os instrumentos são a Avaliação Ambiental Integrada (AAI) e a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), que deveriam preceder os estudos de impactos ambientais isolados de cada usina hidrelétrica prevista e considerar os impactos de todos os projetos na bacia hidrográfica.
O MPF já obteve liminar para obrigar o governo a realizar a AAI e a AAE antes do licenciamento da usina de São Luiz do Tapajós, mas até agora a decisão não foi cumprida e os estudos de impactos ambientais continuam sendo tocados isoladamente para esta usina. No caso da usina de Jatobá, a mesma situação se repete: sem avaliar o impacto cumulativo e sinérgico das cinco barragens previstas, os estudos isolados estão sendo realizados.
“Uma vez implantados os empreendimentos, ainda que sejam considerados impactos insuportáveis pelas populações de peixes afetadas, não se reverterá o fato consumado”, diz o MPF na recomendação. “A ausência de estudos detalhados sobre os impactos que todas as hidrelétricas podem gerar a partir de seu funcionamento conjunto implica a incerteza quanto às conseqüências ambientais e sociais da implantação de tais empreendimentos, ainda mais se considerarmos que tais conseqüências poderão ser irreversíveis”, acrescenta.
CONSULTA PRÉVIA: Nenhuma usina hidrelétrica construída pelo governo brasileiro em tempos democráticos na Amazônia respeitou a Convenção 169 da OIT, que prevê o respeito à autodeterminação dos povos indígenas e tradicionais diante de projetos de extração de recursos naturais da sociedade envolvente. Um dos instrumentos dessa autodeterminação é o direito da consulta prévia, livre e informada, por meio do qual os povos tradicionais devem ser consultados sobre a realização dos projetos que lhes afetem.
No caso da usina de Belo Monte, no rio Xingu, já chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) o processo em que o MPF questiona a ausência das consultas. São Luiz do Tapajós, uma das cinco previstas para o rio que nasce no rio Teles Pires, no Mato Grosso e deságua no rio Amazonas, no Pará, também foi decidida, planejada e está sendo licenciada sem que a consulta prévia aos povos afetados tenha sido realizada. A usina de Jatobá, portanto, será a terceira em território paraense que o governo federal tenta iniciar sem respeitar o direito da consulta. A não ser que acate a recomendação enviada nesta sexta-feira, 24 de janeiro, e suspenda o licenciamento para cumprir a legislação aplicável.
Fonte: RG 15/O Impacto
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