O diretor-presidente da Camargo Corrêa, Dalton Avancini, vai informar ao Ministério Público Federal (MPF), ao prestar depoimento em delação premiada, que a empresa pagou pouco mais de R$ 102,4 milhões em propina para obter contratos de obras na usina de Belo Monte.
Avancini pretende esmiuçar aos procuradores do MPF - em depoimentos que começaram na última sexta-feira e devem se estender durante toda esta semana - que o valor foi repassado para o PT e o PMDB. Cada um dos partidos abocanhou 1% do valor do contrato firmado na usina. Em números absolutos, a empresa repassou R$ 51,2 milhões para cada uma das legendas. A informação, segundo fontes ligadas à negociação da empreiteira com o Ministério Público Federal de Curitiba, foi fundamental para fechar a delação premiada de Avancini. Para convencer os procuradores, o executivo contou detalhes do esquema que funcionava em Belo Monte, e, só a partir daí, eles aceitaram dar ao empresário o direito à delação premiada. Os termos do acordo, que podem prever redução de pena, por exemplo, ainda não foram revelados.
Há informação ainda não confirmada de que o executivo deverá falar também sobre possíveis irregularidades em obras na usina nuclear de Angra 3. No início da semana passada, surgiu a informação de que Avancini revelaria o esquema de pagamento de propina na construção da usina hidrelétrica no Pará. A obra tem custo estimado de R$ 19 bilhões. Os investigadores da Operação Lava-Jato acreditam que Avancini deverá detalhar o possível envolvimento do esquema de arrecadação de propina por parte de Fernando Soares, o Fernando Baiano, apontado como lobista do PMDB. Baiano nega as acusações, mas acredita-se que ele teria intermediado o repasse de vantagens indevidas entre a empresa e representantes do partido. Avancini, que começou a depor na sexta-feira passada ao MPF, também pretende dar o nome da pessoa ligada ao PT responsável pelo recolhimento de propina.
A Camargo Corrêa tem 16% dos contratos do consórcio responsável pela construção da usina, formado por dez empresas: Andrade Gutierrez, Odebrechet, OAS Ltda, Queiroz Galvão, Contern, Galvão Engenharia, Serveng-Civilsan, Cetenco e J. Malucelli, além da própria Camargo Corrêa. Seis destas são investigadas na operação Lava-Jato: Queiroz Galvão, Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS, Galvão Engenharia e Camargo Corrêa. Sete das nove empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato foram responsáveis pela doação de R$ 73,5 milhões para as campanhas de Dilma Rousseff (PT) e de Aécio Neves (PSDB) para a Presidência da República. De acordo com a prestação de contas dos candidatos entregues ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Odebrecht, Camargo Corrêa, OAS, UTC, Queiroz Galvão, Engevix e Galvão Engenharia.
Os 16% de participação da Camargo Corrêa em Belo Monte representam R$ 5,1 bilhões. Para conquistar essa fatia, segundo Avancini, a empresa teve de pagar, a título de propina, cerca de R$ 51 milhões para PT e PMDB. Além de delatar a propina em Belo Monte, Avancini também vai confirmar a existência e atuação do “clube VIP”, cartel de empreiteiras instalado na Petrobras e também em estatais do setor elétrico. Avancini trabalha na Camargo Corrêa há 22 anos. Ele ocupou vários postos na empresa até ser nomeado presidente, em outubro de 2011, depois da Operação Castelo de Areia, que tinha como alvo obras da empreiteira, mas depois foi anulada pela Justiça. Antes de assumir o comando da construtura, o executivo, que é engenheiro civil, ocupou as diretorias de obras de infraestrutura e de óleo e gás.
A assessoria da empresa encaminhou nota: “A Construtora Camargo Corrêa não tem acesso ao referido acordo de colaboração, desconhece seus termos e também o teor dos depoimentos. A empresa reitera que permanece à disposição das autoridades”. Três executivos da Camargo Corrêa estão presos desde novembro do ano passado na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, acusados de participar do esquema de corrupção na Petrobras. Segundo o Ministério Público Federal, ao lado do presidente da UTC, Ricardo Pessoa, do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, eles desviaram R$ 86 milhões de contratos de obras com a estatal.
De acordo com delações feitas por Costa e Youssef, para lavar os recursos desviados, a Camargo contratou duas empresas: Sanko Sider e Sanko Serviços. As empresas emitiam notas frias de serviços não prestados ou superfaturavam compras feitas para obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas, no Paraná, e no Comperj, no Rio. Em seguida, o dinheiro era transferido a empresas de fachada controladas pelo doleiro Alberto Youssef, que, por sua vez, o repassava a Paulo Roberto Costa e a políticos.
Segundo o Ministério Público Federal, R$ 37 milhões dos R$ 86 milhões foram alvo de lavagem de dinheiro. As investigações revelaram 11 atos de corrupção e 117 de lavagem de dinheiro. Foi pedido ressarcimento de aproximadamente R$ 340 milhões (o que inclui multas e danos morais). Em nota, a Secretaria de Finanças do PT informou que não comentaria especulações. “De qualquer forma, informa que o partido recebe apenas doações oficiais e que são posteriormente declaradas à Justiça Eleitoral”. A direção do PMDB também refutou qualquer acusação de que o partido recebeu propina.